Uma análise interessante do caso Relvas é abstrairmo-nos dos
nossos sentimentos em relação à personagem, ignorar a sua face política e
concentrarmo-nos nos comportamentos humanos dos principais intervenientes,
incluindo o Miguel Relvas.
Comecemos pela questão da licenciatura, um tema muito
querido dos portugueses e em relação ao qual somos contraditórios. Quantos não
desejariam serem tratados por “doutor” e sempre que podem desvalorizam quem o é.
O próprio Relvas é contraditório, não perde a oportunidade de dizer que subiu a
pulso e de valorizar a sua disponibilidade para aprender fora de um sistema
formal de ensino, mas não resistiu à tentação do título.
Vejamos agora a forma como a conseguiu, ficamos com a ideia
de que o maroto enganou uma universidade sem credibilidade que obtém receitas
vendendo diplomas. Terá sido mesmo assim ou alguém a quem deveria caber a
defesa da honorabilidade da universidade optou por sugeria a Relvas que
aparecesse na Lusófona que se arranjava maneira de entrar lá com o secundário
saindo logo de seguida doutor? O caso Relvas não é um mero erro administrativo
ou um conflito de regulamentos internos, revela a dimensão humana de alguns dos
nossos “catedráticos” da treta.
O que dizer de uma justiça, designadamente, de um Ministério
Público que no caso Sócrates investigou tudo, desde a licenciatura aos desenhos
de construção civil e agora, no tal tempo em que terá acabado a impunidade,
nada fez, acabando agora por ficar com o processo enviado pelo próprio ministério?
Cavaco Silva decidiu aproveitar o caso Relvas para puxando
dos seus galões de professor defender a honra e a credibilidade das academias,
como se as universidade privadas não se tivessem multiplicado como cogumelos,
no teu tempo e na sua quase totalidade dirigidas por gente ligada ao PSD do seu
tempo. Mas, pior do que isso, é que a autoridade moral de Cavaco Silva para
falar do tema não é das melhores, puxando um pouco pela memória dos portugueses
vem-nos à memória que Cavaco Silva foi alvo de um processo disciplinar
arquivado de forma pouco clara, foi acusado na Universidade Nova de faltar
excessivamente.
Os mesmos jornalistas que há poucos dias bajulavam Miguel
Relvas, que ignoraram todas as barbaridades que ele fez na comunicação social,
que se esqueceram de ser solidários com a colega do Público que foi perseguida
pelo então ministro, atiram-se agora ao mesmo Relvas de forma muito corajosa.
Essa gente ainda tem na boa o gosto dos ditos do Relvas, tanto foi o tempo que
passaram a a lambê-los agora que ele já
não pode influenciar os negócios no sector são muito corajosos.
Por fim, a forma indecente como o velho amigo Passos Coelho
se serviu de Relvas, manteve-o durante meses e quando era acossado por todos os
lados usou o amigo como um bocado de carne podre que se atira aos lobos para os
distrair. Passos Coelho segurou Relvas até ao momento em que lhe foi útil,
quando estava à beira da queda, atacado por uma moção de censura, com um
Tribunal Constitucionbal a declará-lo incompetente atirou Miguel Relvas às
feras no meio da arena para divertimento da populaça.
Relvas é o que é, terá as suas qualidades e defeitos tudo
levando a crer que o peso dos segundos é muito maior do que o das primeiras,
mas a verdade é que muitos dos que estão benzendo a sua honra com o sangue de
um Relvas caído em desgraça são ainda piores do que o Relvas. O Relvas vai
desaparecer, mas essa gente nojenta vai continuar a dominar a nossa vida política,
a governar, a investigar ou a manipular a informação.