O governo de Passos Coelho está a cometer os mesmos erros que cometeu o governo de Sócrates no domínio da política económica, se Sócrates tinha excesso de optimismo e adiava a adopção de medidas que se revelaram inevitáveis, o governo de Passos Coelho anda atrás dos acontecimentos e cada vez que Vítor Gaspar aparece é para se saber que vai ser decidido mais um PEC IV. E se Sócrates não resistiu ao eleitoralismo no momento de escolher os sacrificados pela austeridade Passos Coelho é mais cínico e vai tentando assegurar uma base eleitoral de descamisados à custa dos aumentos de impostos sobre a classe média, até os tais “gandulos” que a direita acusava de se recusar a trabalhar para receberem subsídios acumulam agora mais algumas estatais.
A política económica de Passos Coelho está a estilhaçar todos os equilíbrios sociais e como se isso não bastasse despreza a coesão nacional ao esquecer o PS nos processos negociais quando negoceia novos acordos com a troika sem qualquer consulta à oposição. Se no princípio o PSD não se cansava de tentar imobilizar politicamente o PS invocando que o acordo com a troika tinha o apoio de 80% dos deputados agora faz novos acordos apenas com o base no apoio parlamentar da direita. Pior ainda, o mesmo PSD que exigia a publicação do acordo inicial com a troika adopta agora acordos que mantém em silêncio e que aparecem na comunicação disfarçados de recados do Vítor Gaspar.
O conjunto de medidas que o PSD já adoptou para além do exigido pelo acordo inicial com a troika são no seu conjunto mais brutais do que era o PEC IV e as medias que Vítor Gaspar prometeu para 2012 são outro PEC IV, tudo junto o Gaspar já decidiu o equivalente a três PEC IV e a maioria das medidas foram decididas e negociadas no seu gabinete à margem de qualquer processo negocial, e pior do que isso, do parlamento. Para o ministro das Finanças o parlamento é um teatro de marionetas e o princípio elementar que cabe ao parlamento decidir aumentos de impostos é ignorado sistematicamente, Vítor Gaspar parece mais um dos boys de Chicago do Chile de Pinochet do que o ministro das Finanças do Portugal democrático, tem uma missão que considera divina e ele é que sabe que impostos deverão ser aumentados e quais as despesas que deverão ser cortadas, ele e só ele.
E enquanto a austeridade vai sendo agendada para mais tarde o governo comporta-se como o fumador que decide que vai deixar de fumar no dia seguinte e tomada a decisão a primeira coisa que faz é puxar pelo cigarro, ao mesmo tempo que se prometem cortes históricos da despesa não se vê nada neste capítulo em 2012, os tais consumos intermédios continuam a realizar-se a bom ritmo. O governo tem muita coragem para agendar austeridade, mas muito pouca na hora de a executar, parece que ainda não está a enfrentar os tumultos imaginados por Passos Coelho e já está a fazer xixi pelas pernas abaixo.
E como o crescimento foi agendado lá para 2013 todos os ministros anda a brincar à austeridadezinha, não temos, por exemplo, um ministro da Economia, temos um ministro invisível da reestruturação do ministério da Economia e, ao que parece, a medida mais importante do Álvaro foi mudar a sua mesa para o quintal, uma originalidade que deve ter aprendido no Canadá. O rapaz da Lambreta é um distribuidor de gorjetas sociais e a ministra que era supostamente da Agricultura em vez de embirrar com as importações de produtos agrícolas preferiu embirrar com as gravatas. Nos dossiers económicos este governo roça a irresponsabilidade, os ministros parecem ser estudantes do ensino básico a brincar aos governos.
A economia europeia está a afundar-se na indecisão e é necessária uma resposta nacional à crise, uma resposta que permita adoptar todas as medidas necessárias e que estas sejam compreendidas por todos os portugueses. Isso significa que o Presidente da República não pode desaparecer e mandar os seus incondicionais fazerem umas críticas e o Vítor Gaspar deve perceber que em, Portugal está instituída uma democracia e que em democracia não há salvadores da pátria, isso é coisa de ditaduras. A resposta nacional à crise financeira nacional e europeia passa pelo diálogo político e não pelo silêncio das paredes do seu gabinete.