terça-feira, outubro 18, 2011

Greve geral?

Ainda muitos portugueses estão deitando contas à vida para saberem como vão perceber como irão sobreviver ao saque fiscal feito por um falcão com ares de sem-abrigo e já as centrais sindicais agendaram uma greve geral, da qual resultará pouco mais do que a perda de um dia de ordenado. As graves gerais são formas de luta arcaicas sem outro objectivo senão dar tempo de antena as líderes sindicais profissionais que há anos que dizem a mesma coisa. À noite é certo que aparecerá Jerónimo de Sousa a reclamar a vitória para o seu glorioso partido, enquanto sindicalistas e governo confrontam resultados de adesão com sessenta pontos percentuais de diferença.

Como todas as outras greves gerais esta será mais um fracasso, os trabalhadores estão quase sem dinheiro, muitos trabalham em situação precária ou em pequenas e médias empresas, os funcionários públicos têm sido massacrados por greves que lhes custou muitos dias de vencimento. Além disso, muita gente não se esquece que são os que agora querem enquadrar o protesto que nos últimos anos mais se bateram pela ascensão da direita ao poder, Passos Coelho deve mais à máquina do PCP, do BE e da CGTP pela sua vitória eleitoral, do que ao aparelho do PSD.

Em tempos houve uma cegonha que provocou uma paralisação no país que nenhuma greve da CGTP conseguiu, e não custou um único dia de ordenado aos trabalhadores. E essa cegonha fez mais mossa na imagem de António Guterres, o então primeiro-ministro, do que qualquer discurso inflamado de Carvalho da Silva ou do que a melhor piada de Francisco Louçã.

Uma greve de zelo e o cumprimento escrupuloso do horário de trabalho por parte de todos os funcionários públicos terá maior impacto e adesão do que uma greve geral. Nenhum tribunal, nenhum hospital, nenhuma repartição de finanças, nenhuma esquadra a PSP funcionará se todos os funcionários se recusarem a trabalhar para além das horas que lhes são remuneradas.

Dezenas de greves espontâneas, recorrendo ao humor e sem os cartazes com o habitual design do PCP serão muito mais eficazes do que uma mega manifestação da CGTP enquadrada pelas caras do costume. Além disso, sem o apoio da máquina autárquica do PSD é pouco provável que a CGTP volte a organizar as grandes manifestações que promoveu nos últimos anos. Até a autarquia de Castro Marim, uma localidade rural gerida pelo PSD onde não há qualquer tradição sindical, enchia os autocarros oficiais com velhos para virem engrossar as manifestações da CGTP.
 
O boicote às cerimónias oficiais, o boicote ao consumo de produtos das empresas cujos patrões têm tido um papel activo nas campanhas eleitorais (Belmiro de Azevedo [Continente, Óptimus], Carrapatoso [Vodafone], Soares dos Santos [Pingo Doce], etc.) e outras iniciativas terão mais impacto do que acções que visam passar numa comunicação social que está claramente mais interessada no negócio da privatização da RTP ou nos orçamentos publicitários dos grupos empenhados no apoio a estas políticas.

Para as manifestações habituais do PCP e da CGTP o governo de Passos Coelho está mais do que preparado, do que não está preparado é para a manifestação espontânea de uma classe média não enquadrada por sindicalistas profissionais. Não está preparado para o humor, para uma greve de zelo sem data limite, paras o boicote aos negócios dos seus financiadores, para dezenas de pequenas manifestações espontâneas do mais diverso tipo, para o desprezo dos cidadãos por um poder que abusa sem limites e sem o mais pequeno respeito por princípios de equidade e justiça social.