Começo a ter inveja do ar que se respira nas redacções dos jornais, nas sedes partidárias ou nos sindicatos, respira-se liberdade e democracia como não se fazia há quase seis anos, é como se o ar andasse mais oxigenado. Acabou a longa noite da asfixia democrática e este excesso de oxigénio até leva os nossos velhotes a delirar ao ponto de já verem vacas a rir, um dia destes ainda vamos ao Parque Eduardo VII e damos com porcos a andar de bicicleta ou mesmo um rebanho de ovelhas a jogar à bola.
O pessoal da Presidência já pode telefonar e mandar emails descansados, os assessores já podem combinar manobras com jornalistas sem recearem escutas, os jornalistas já não são obrigados a noticiar maravilhas governamentais, agora respira-se liberdade. O Mário Nogueira anda tão feliz que já não faz esperas ao primeiro-ministro, antes pelo contrário, recebe-o abaixando a cabecinha como se fosse um súbdito da Rainha de Inglaterra a falar com sua majestade, só lhe falta bater os calcanhares. Os sindicatos já não são invadidos por agentes da PSP desorientados pelo trânsito, o direito de um professor chamar filho da puta ao primeiro-ministro já é uma liberdade inviolável.
Até o PCP parece ter desistido de opor à maioria no parlamento a sua maioria nas ruas, as manifestações da CGTP parecem piqueniques do Bloco de Esquerda, são tão poucos que só não ganham a notoriedade pública do pessoal da Casa dos Segredos porque agora as televisões ignoram-nas. Carvalho da Silva deve estar feliz, a mobilização correu mal mas pelas notícias soube que a PSP foi à manifestação para compor a coisa, até deve ter dado jeito tirarem muitas fotografias pois os manifestantes sempre podiam fazer o sorriso ensaiado para aparecer na primeira página do Público ou na abertura do telejornal da SIC. O empenho policial foi tanto que até a secreta pediu folga na Ongoing e foi à manif.
O empenho governamental em que tudo corra bem e não se regresse aos tempos escuros da repressão é tal que até assegurou as necessárias verbas orçamentais para que as muitas polícias que nós temos possam estar presentes em todas as iniciativas, assegurando que possamos continuar a respirar este ar oxigenado. Enquanto na Madeira o povo vai mais uma vez votar em liberdade para escolher e, porventura, reforçar a sua maioria absoluta, finamente os do Contenente e dos Açores sentem a liberdade de quem se livrou da asfixia democrática.