Sejamos honestos, essa coisa de Portugal ir ao mercado não é
assim tão diferente como ir à Feira do Relógio, há feira todos os domingos e
nela as botas da Timberland são tão genuínas como as operações financeiras do
Gaspar, umas são produzidas em contrafacção, o dinheiro vem embrulhado em papel
do BCE. Mas associar a ida aos mercados ao crescimento económico ao mesmo tempo
que se tenciona despedir mais 100 mil trabalhadores, aumentar os impostos para
cobrir os impostos que ficaram por cobrar devido ao último aumento e destruir
um Estado e uma forma de vida é coisa de doidos.
Os países e os povos não se reformatam, já não estamos no
tempo do Estaline que se podia dar ao luxo de dispersar povos que tinham
apoiado o invasor nazi ou, pelas mesmas razões, transformar toda uma Ucrânia
numa região agrícola. Os governos não podem decidir que um povo deve deixar de
ter classe média para que todos ganhem um salário mínimo cada vez mais pequeno,
ou pensar que podem forçar os jovens a perder a ambição e a aceitarem um
programa de formação de torneiros.
EM condições normais Portugal ia ao mercado todas as semanas
ou todos os meses e isso não tinha deixado de suceder se não fosse o empenho
das agências de notação e de alguns políticos traidores para que as economias
mais frágeis borregassem e cedessem de forma a aumentarem os juros ganhos pelos
investidores.
Os que hoje mostram orgulho por irem ao mercado foram os que
há dois anos festejaram e tentaram desdramatizar o pedido de ajuda internacional.
Os que hoje falam em crescimento são os mesmos que há dois anos que andam a
elogiar as consequências da recessão e que viram na quebra das importações ou
na emigração forçada dos nossos melhores jovens um sinal de sucesso das suas
políticas.
Só alguém muito doente acha que com uma recessão ao nível da
zona euro, quebrando a procura interna, destruindo a concertação e o diálogo
político, mantendo ministros incompetentes, apoiando-se nos pitbulls da banca
portuguesa se promove crescimento.
Sejamos mais honestos, é mais provável que o crescimento
chegue graças à actividade gerada pela Feira do Relógio do que pelas encenações
financeiras do Vítor Gaspar, encenações que servem apenas para disfarçar o
extremismo das políticas que já adoptou e a incompetência evidente no relatório
que pediu ao Salassie para assinar em nome do FMI.