Quando se fala de pobreza é costume estabelecer um limiar de pobreza e um país é tanto mais pobre quanto maior for o número de cidadãos que vivem abaixo ou próximos desse limiar de pobreza. Perante os dados que aponta para grandes desequilíbrios conclui-se que a um elevado nível de pobreza corresponde um elevado nível de injustiça na distribuição dos rendimentos, a conclusão directa é a de que se os pobres são muitos é porque a riqueza está concentrada em poucos.
O problema é que na hora de tributar os ricos temos de definir o que se entende por ser rico e aí é que muito provavelmente está o maior indicador da pobreza deste país. Se o salário mínimo baixo é um sinal de injustiça, estabelecer que alguém que ganha 2000 euros líquidos é socialmente favorecido ao ponto de em termos fiscais ser tratado como rico é talvez o maior sinal de pobreza do país. Um país onde ganhar 2000 euros é ser rico tem mesmo de ser muito pobre e, pior ainda, é duplamente pobre, pobre de riqueza e pobre de espírito.
São os ricos os tesos que ganham 2000 euros líquidos que enchem as universidades de estudantes, que dão os médicos ao nosso SNS, que dão a maioria dos quadros ao Estado e ao sector privado. E para o fazer têm de suportar uma boa parte das despesas do seu bolso, deslocações, propinas, livros, materiais, deslocações ao estrangeiro, tudo isso é suportado pelos tais ricos tesos. Muitas das famílias que conheceram a falência nos últimos anos foram precisamente esses ricos tesos, tiveram de vender as casas se estas não foram penhoradas e vendidas ao preço da uva mijona pelo fisco, algumas tiveram de tirar os filhos das universidades, muitas deixaram de gozar férias.
São estes ricos tesos que menos se escapam às suas obrigações fiscais, seja do sector público ou no sector privado, o tipo de rendimentos de que beneficiam dificilmente se escapam ao IRS e o seu padrão de consumo leva a que sejam os alvos privilegiados dos impostos sobre o consumo. Falamos de classes profissionais que não cobram por biscates, que não recebem "por fora" o que ganham acima do ordenado mínimo. a a ideia de que em Portugal os pobres são os que pagam impostos e acima destes todos se escapam, mas a verdade é que os grupos sociais que menos cumprem com as suas obrigações fiscais são os mais ricos e os mais "pobres". Há claramente duas economias paralelas, a dos ricos que assenta em esquemas internacionais e financeiros e a dos "pobres" e dos "micro empresários" que trabalham sem pagar impostos e contribuições. No meio ficam os estatisticamente ricos que de crise em crise, de governo em governo estão cada vez mais tesos.
Em Portugal há sectores inteiros onde não se pagam impostos para além do mínimo e grupos profissionais cuja folha de ordenado só refere o mínimo obrigatório, o salário mínimo. Aliás, fala-se muito do salário mínimo como um referência de rendimentos, mas a verdade é que em sectores como a restauração, a construção civil e a imensa economia do biscate este ordenado serve de referência a artir do qual se deixa de pagar impostos e tudo é pago por fora.
Mas na hora da crise a única solução é aumentar impostos e só é possível conseguir um aumento de receitas fiscais à custa daqueles que não se podem escapar à retenção na fonte do IRS, isto é, os tais ricos tesos que desde há anos que são tratados como vacas numa sala de ordenha colectiva chamada fisco. No tráfico da droga existem as mulas, nas crises financeiras portugueses existem as vacas e nos últimos tempos Passos Coelho inventou uma solução ainda mais expedita, alem de aumentar os impostos para alguns, os funcionários públicos, decretou a semi-escravatura, trabalham parcialmente à borla, digamos que para estes foi instituída a semana de trabalho nacional, um quarto do seu trabalho deixou de ser remunerado.
Veremos o que vai suceder quando estes pobres tesos deixarem de ter recursos para continuarem a ser ordenhados ou quando descobrirem que no resto da Europa deixa de ser tratados desta forma. Nessa altura os nossos governos terão de encontrar nos que cá ficarem, os muitos ricos que praticam o mecenato com muitos dos nosso políticos e os muitos pobres cujos votos são mais fáceis de manipular, os recursos humanos necessários ao desenvolvimento, os tais jovens empreendedores de que tanto falam, os quadros qualificados necessários ao Estado e as empresas inovadores, os médicos e todos os outros profissionais necessários ao país.