O primeiro-ministro festejou o aumento de candidaturas e colocações no ensino superior público como sendo um resultado da recuperação de rendimentos e um sucesso para o país. Sobre a questão da recuperação dos rendimentos tenho muitas dúvidas, essa recuperação ocorreu nos vencimentos mais baixos do Estado e é pouco provável que seja esse grupo a colocar mais estudantes no ensino superior público.
Um dia será feito um estudo sério sobre o que se passou em Portugal e saberemos toda a verdade sobre as motivações ideológicas dos cortes dos rendimentos, a mentiras que foram ditas aos portugueses para os levar a estarem calados, bem como o que, depois da suposta recuperação de rendimentos, resultou em termos de destruição da classe média.
Preferia ver o primeiro-ministro, o ministro das Finanças e o ministro da Economia dizerem algo mais sobre que perspetivas terão estes jovens quando, daqui a cinco anos, concluírem os seus estudos. Teremos uma vaga de jovens qualificados a enriquecer o país, teremos advogados, arquitetos e muitos outros profissionais a ganharem o salário mínimo para enriquecerem gente oportunista ou teremos mais uma vaga de emigração de jovens que fogem do país?
Na mesma semana em que se comentou a colocação no ensino superior também foi notícia um relatório da OCDE que conclui que Portugal é o país me bro daquela organização com maior abandono escolar e que metade dos estudantes do ensino secundário chumba pelo menos um ano. Quem vai engrossar os postos de trabalho daqui a cinco anos, os jovens que, entretanto, abandonaram o ensino escolar ou os que depois de licenciados se sujeitam a fazer desenho de auto cad ou reposições nos supermercados? Quantos dos mais qualificados conseguirão ficar no país?
Vivemos num país onde a Catarina Martins diz que os rendimentos dos escalões mais elevados do IRS não são rendimentos do trabalho e por isso devem ser penalizados para “ajudar” os rendimentos mais baixos, onde um ex-secretário de Estado considerou ricos os que ganham 2000 euros, e tenho dúvidas de que muitos desses 45.000 estudantes que ingressaram no ensino superior estejam dispostos a sofrer aquilo que nos foi imposto nos últimos anos.
Quererão entrar para as profissões altamente qualificadas do Estado para depois aparecer um Passos Coelho a cortar 30% dos rendimentos ou a ouvir as baboseiras do Sousa Tavares para quem os funcionários públicos a tudo devem estar sujeitos? Estarão interessados em suportar uma carga fiscal brutal vendo o seu rendimento aproximar-se do salário mínimo? Quererão ir para escritórios de advogados conhecidos e ganhar pouco mais do que um salário mínimo?
Sem esses jovens o país não conseguirá desenvolver-se, precisamos que eles fiquem, precisamos que eles acedam a colocações compatíveis, precisamos da sua capacidade de criar riqueza. Ainda bem que entraram mais uns quantos alunos no ensino superior, mas vou guardar a alegria para quando depois de formados conseguirem colocações dignas no nosso país. Se isso não suceder é mais uma perda de uma geração e continuaremos a financiar as economias dos países mais ricos formando-lhes a mão de obra mais qualificada. Exportamos jovens qualificados e importamos velhos reformados.