Quando os funcionários públicos perderam 10% dos seus
vencimentos, todos os outros portugueses ficaram calados, muitos aprovaram pois
por um motivo ou outro odeiam o Estado. Somos um pais de empresas pouco
competitivas e que fugimos ao pagamento dos impostos, mas exigimos ao Estado
uma qualidade que não temos nas nossas empresas e queremos que o Estado nos dê
aquilo a que nos furtamos a pagar.
Os meus amigos pensionistas deram-me palmadinhas de conforto
nas costas, que a medida era justa. Mas quando cortou os subsídios aos funcionários
e pensionistas os meus amigos substituíram as palmadinhas pelo ranger de
dentes, ranger de dentes que aumentou de intensidade quando souberam que lhes
ia ser igualmente aplicado o corte de 10%.
Mas se os pensionistas entraram no clube dos inúteis da
sociedade portuguesa o sector privado ainda vivia fora da austeridade, Portugal
passou a ser um país com dois sistema, de um lado o sector dos produtivos e do
outro os dos inúteis, odiados pelos liberais do governo e eleitos para serem as
vítimas da sociedade. Haviam estudos a provar que eram malandros e que ainda
por cima ganhavam mais, enfim, eram uma espécie de gregos a viver em Portugal.
O Cavaco, um dos nossos colecionadores de pensões a cujo
rendimento juntou o conforto de lucros asiáticos nas suas acções de uma empresa
falida e gerida por criminosos, achou que não se tinha de preocupar com os
direitos dos nossos “gregos”, estes eram ricos e não seria a eles que se
referia quando dizia que haviam limites para a austeridade. Havia coisas mais
importantes a tratar, como a libertação do Estado, de que a venda em regime
acelerado do Pavilhão Atlântico foi o exemplo simbólico. Tudo estava a correr
bem, o homem das finanças da campanha presidencial e emissário junto da
candidatura de Passos Coelho já ganhava 50.000 na EDP e o Pavilhão Atlântico
ficou na família a preço de saldo.
Só que a Europa arrastou os pés, os preços dos combustíveis
subiram, os portugueses encolheram-se nas lojas, as exportações começaram a
cair e o Álvaro não percebeu que os estivadores não tinham medo dele. As contas
afundaram-se e estavam criadas as condições para o Gaspar seguir com a sua
estratégia de transferência de riqueza, em vez de baixar a TSU, aumenta o IRS e
baixa o IRC. A desvalorização fiscal dos trabalhadores para criação de lucros
artificiais às empresas que não souberam ou não quiseram ser competitivas
continua em marcha.
Afinal a estratégia do Gaspar não era lixar a Função Pública,
era lixar todos os portugueses e quando se percebeu a manobra é o ai Jesus. Os
mesmos jornalistas que escreviam artigos sugerindo uma ditadura do Gaspar, um
salazarismo começado por “g”, estão agora indignados, vão provar da mesma
receita que aprovaram quando era para consumo exclusivo de funcionários públicos.
Todos os que apoiavam o Gaspar com ar de grande sacrifício, até parecia que
sofriam todos de um abcesso no dente do siso, estão agora revoltados com o
excesso de austeridade.
Sejam bem-vindos à austeridade. Aqueles que apoiaram o corte de mais de 30% do rendimento aos funcionários e pensionistas certamente que aguentam mais austeridade, como diz o Fernando Ulrich "Ai aguentam, aguentam". E agora é a vez de os patrões exigirem que no privado hajam condições idênticas no Estado, aí não há cartões visas para despesas pessoais, carros de serviço nas garagens do supermercado, prémios no fim do ano, ou outras benesses.
Os portugueses estão caindo que nem patinhos na estratégia de Passos Coelho de impor o seu modelo neo-fascistas divindo os e lançando deliberadamente o país na maior crise financeira da sua história.