sexta-feira, novembro 04, 2016

A ADSE e o oportunismo dos governos

A ADSE surgiu num tempo em que servi de compensação pelos vencimentos miseráveis que se pagavam no Estado, situação que não melhorou tanto quanto se diz, ainda que a propaganda da direita, com destaque para o discurso político de personalidades como Miguel Cadilhe, Cavaco Silva, Manuela Ferreira Leite e Passos Coelho, tenha criado na população um estigma contra os funcionários públicos, acusados de ganharem o que não ganham e de trabalharem menos do que trabalham. 

Passos Coelho decidiu fazer com que os funcionários públicos fossem “executados” nos fornos da austeridade e espoliou-os de todas as formas possíveis, um dos truques a que recorreu para ampliar os cortes nos rendimentos foi fazer com que a ADSE apresentasse lucros. Com descontos de 3,5% sobe o rendimento bruto os funcionários transformaram a ADSE no mis lucrativo sistema privado de saúde. De caminho ainda empregava bois, pagavam 40 milhões por ano em inspeções médicas que cabem ao Estado e davam assistência gratuita a filhos, conjugues sem trabalho e mais alguns familiares, substituindo-se ao OE e poupando ao Estado muitos médicos de família.

Na lógica salazarista a ADSE era um esquema corporativo, correspondendo às muitas caixas de previdência, todos os funcionários contribuíam com uma percentagem do que ganhavam e tanto eles, como os seus familiares beneficiavam d proteção oferecida com a ADSE. O Estado financiava uma parte substancial da despesa e ditava as regras, alargando o benefício a familiares dos funcionários. Se, por um lado, estes benefícios podiam ser considerados uma benesse, por outro, era uma poupança para o SNS.

Hoje a ADSE é inteiramente suportada pelos funcionários públicos, mantendo-se o principio da solidariedade, na medida em que cada um contribui em função do que ganha, descontando 3,5% do seu rendimento. Além disso, deixou de ser uma benesse, não só as receitas são superiores aos custos como suportam cuidados de saúde a muitas dezenas de milhares de cidadãos beneficiários que não dão qualquer contributo e que, supostamente, deviam beneficiar desses cuidados no SNS.

Nos dias de hoje a ADSE é um subsistem quase privado de saúde, muito Cró para os que mais ganham, sendo caro porque suporta custos (familiares que não descontam, enteados, avós e conjugues que não trabalham, para além das despesas denunciadas pelo tribunal de Contas, como as inspeções médicas). Não é por caso que algumas entidades privadas assediam os funcionários públicos mais bem remunerados com sistemas privados de saúde, usando como argumento o facto de serem mais baratos do que a ADSE.

Os governos mantiveram a ADSE mas apenas porque esta dá lucro ao Estado, retira quase um milhão de cidadãos do SNS, poupando ao Estado muitos mais milhões do que custava a ADSE e permite aos ministros da Saúde aliviar a pressão sobe os seus orçamentos. Só que este proxenetismo está a ir longe demais, já fizeram tantos cortes aos funcionários, já lhes retiraram todas as benesses, já os equipararam aos trabalhadores do setor privado, tendo sempre por referência as piores situações. É bem provável que os trabalhadores melhor remunerados do Estado comecem a abandonar a ADSE, trocando-a por sistemas privados e mais tarde ou mais cedo a ADSE morrerá, devido a excesso de oportunismo político dos governos.