Portugal vive em estabilidade política, o Presidente até pode dedicar os seus discursos à importância das condições meteorológicas para a produtividade dos nabos, o primeiro-ministro já não sabe como entreter os jornalistas e fala do que vai fazer daqui a dois anos. Mas o que os dois senhores da direita que nos governam tentam fazer é iludir a crise empurrando o calendário com a barriga, tentam criar um vazio nos dois anos que nos separam das eleições legislativas.
Mas a realidade não é a que querem Cavaco e Passos Coelho e nem eles estão em condições para a manipular ou mesmo gerir, Cavaco é um Presidente descredibilizado e Passos Coelho é um primeiro-ministro em quem ninguém confia, os portugueses não confiam na sua palavra, na sua competência, no se programa, nos seus ministros ou nas suas intenções. As televisões já não os acompanham para saberem o que dizem, a notícia deixou de ser o que dizem mas sim os apupos que ouvem. A situação é de tal forma ridícula que um bom desempenho de Cavaco é avaliado pelo ruído dos apupos.
Se um país não acredita, não confia nem se revê no presidente e no governo que foram eleitos e a sua esperança reside nas entidades ou órgãos de soberania que não foram eleitos é a própria democracia que está em causa. Se os portugueses preferem confiar no presidente do Tribunal Constitucional do que no Presidente da República ou se qualquer militar com a patente acima de sargento desperta mais esperança do que um primeiro-ministro das duas umas, ou convoca eleições antecipadas ou espera por uma revolução ou por um golpe de Estado.
Cavaco Silva e Passos Coelho podem negar a realidade, podem negar a realidade e tentar debater o daqui a um ou dois anos, podem desprezar e ignorar as oposições ao mesmo tempo que falam em consensos, até podem dizer que as eleições prejudicam o país. A verdade é que numa democracia espera-se que os governos prezem a democracia e respeitem os cidadãos. Ora, a governação de Passos que é apoiada por Cavaco assenta no pressuposto de que os cidadãos devem ser enganados e tratados sistematicamente como parvos, o governo comporta-se como se vivêssemos em democracia e não tendo a repressão para impor as suas políticas recorre à mentira.
Esta estratégia combinada com o medo e a manipulação da informação não tem futuro, os investidores estrangeiros não confiam no país, os investidores nacionais não correm riscos, os governos estrangeiros percebem que não vale a pena negociar com um governo sem futuro e mais cedo ou mais tarde a troika vai perceber que o governo português não é um interlocutor adequado para discutir o futuro do país.
A crise está instalada e de nada servirá a Cavaco seguir a sugestão de Passos e discutir o pós troika, falta demasiado tempo para o fim da legislatura, a Europa tarda em mudar de políticas, o desemprego cresce exponencialmente, a receita fiscal afunda-se e a recessão agrava-se. Num país assim os cidadãos não acreditam no país, os empresários nacionais fogem, os investidores estrangeiros evitam o país, mais tarde ou mais cedo será a troika que está a negociar com um governo sem auteridade apoiado e mantido por um Presidente sem credibilidade.
Cavaco está a provar do seu próprio veneno, tenta adiar presidir com um ano de avanço numa tentativa de negando a realidade poder recusar ao povo o direito de escolher um governo em que confie. Cavaco quer e não vai ter o tempo que negou a Sócrates.