Talvez porque a história foi generosa com o nosso país somos pouco cuidadosos no que respeita a salvaguardar a nossa segurança em relação ao futuro. Isso explica uma boa parte da actual crise financeira. Se é verdade que foi desencadeada pelas crise financeira internacional, também é verdade que não houve o cuidado de manter a dívida soberana em níveis razoáveis. O descuido foi coelactivo, ainda há meses a actual secretária de Estado do Tesouro negociava com os swap, Passos Coelho nunca fez a mais pequena referência à dívida nas suas intervenções públicas, Cavaco foi o autor moral do desastre e a austera Ferreira Leite eestava mais proecupada com a forma como eram decididas as obras públicas do que com o seu financiamento.
Portugal é um país vulnerável não apenas no plano financeiro, mas também nos sectores energético e alimentar, o país depende da ajuda financeira externa, abastece-se com energia importada e depende do estrangeiro para se alimentar. Se agora o problema do fornecimento de energia e do abastecimento alimentar é uma questão meramente financeira e havendo dinheiro a questão pode ser esquecida, a verdade é que tal como em relação a dívida soberana estamos nas mãos dos nossos parceiros europeus e, no caso da energia, a situação ainda é pior.
Se hoje os nossos parceiros europeus ficam muito agradados por nos empaturrarem com queijos desnecessários e excesso de bolachas e de carne, que depois pagamos com o dinheiro que nos emprestaram através da troika, num cenário de crise alimentar nem com a ajuda do Gaspar os alemães nos mandam uma lata de salsichas. Se esta questão anão se coloca,ainda que muito recentemente tenham ocorrido dificuldades de abastecimento nalguns produtos essenciais, a verdade é que a prazo o problema é muito real. Países e empresas mais prevenidas estão investindo a prazo, porque o problema da segurança alimentar deve ser analisado com cenários de décadas.
O aumento do consumo alimentar nas economias emergentes (China, Índia, Brasil, Rússia, etc.), a ocupação crescente de terras férteis para a produção de bio-combustíveis e as consequências das alterações climáticas estão conduzindo o mundo a uma crise alimentar de grandes dimensões. É neste quadro que vemos a China adquirir terras férteis e empresas do sector agro-industrial, ainda recentemente comprou a Smithfield Foods, dona da espanhola Campofrio e maior produtora americana de carne de suíno. Se um dia destes alguma empresa comprar Alqueva e arredores ninguém se admire e Portugal terá poucos motivos para festejar o tão bem-vindo investimento estrangeiro, a verdade é que a China terá ficado com uma boa parte das nossas terras aráveis para alimentar a sua população.
Se um dia Portugal tiver dificuldades de abastecimento alimentar uma qualquer Merkel vai dizer que o país não cuidou da sua segurança e em vez de investir na sua alimentação optou por comprar carros de luxo. Vai aparece um Passos e um Gaspar a defender que o povo deve ser castigado com fome porque foi descuidado e pecaminoso, muti provavelmente vai descobrir que os funcionários públicos, por serem gandulos e desnecessários, não precisam de se alimentar, não tendo direito às senhas de abastecimento.
Portugal precisa de reflectir seriamente sobre a sua segurança financeira, energética e alimentar. Mais do que por uma questão de obediência à Alemanha ou pela patetices de Durão Barroso o país precisa de uma grande reflexão sobre o seu problema financeiro. Da mesma forma deve reflectir como conseguirá os necessários fornecimentos de energia num contexto de escassez ou como poderá assegurar a segurança alimentar num quadro de escassez alimentar.
A grande lição da actual crise financeira é que a União Europeia não passa de uma quimera que será mantida enquanto alguns países tiverem a ganhar com o mercado dos vizinhos europeus, não há uma Europa capaz de enfrentar uma grande crise como se fosse um desafio colectivo, perante as dificuldades cada país esquece o interesse colectivo e opta pelos seus próprios interesses, usando para isso o mais cínico dos argumentos, a vontade dos seus eleitores. Vai ser vontade dos eleitores franceses enviar leite que falta aos franceses, os eleitores escoceses mandarão o seu petróleo se as suas estações de serviço estiverem vazias? Os eleitores franceses ainda nos vão mandando dinheiro, mas porque o conseguem a 0% para o vender a 3% e porque o governo português aceitou um ministro das Finanças que responde perante eles e diz no parlamento português que não foi eleito para coisíssima nenhuma.