Hoje é evidente que o processo de globalização trouxe grandes benefícios a alguns países enquanto outros sofreram graves consequências. A indústria alemã, mais poderosa, incorporando mais valor acrescentado e tecnologicamente mais evoluída ganhou muito com a abertura de novos mercados em economias emergentes. Em compensação, economias menos industrializada, exportando produtos de baixo valor acrescentado e mais vulneráveis aos preços da energia ficaram a perder, sectores inteiros quase foram à falência, foram abandonados por muitas multinacionais que preferiram deslocalizar a sua produção para países com a mão-de-obra ainda mais barata.
Hoje ninguém questiona que uma união monetária incompleta, sem quaisquer instrumentos de regulação e um BCE com estatuto de observador, não passa de uma união monetária selvagem, dependente dos especuladores. Uma união monetária sem qualquer banco central digno desse nome só poderia ter o resultado que teve, favorecer os mais fortes e destruir os mais fracos. Chega-se ao cúmulo de a Alemanha ter beneficiado do financiamento da sua dívida com juros negativos, como se o mundo estivesse em guerra e os investidores apenas ambicionassem não perder muito dinheiro.
Ninguém reparou no impacto da globalização? Ninguém se interrogou sobre as consequências de uma união monetária quase medieval?
Reparar, repararam, mas a ambição de chegar ao poder ou de se vingarem de adversários políticos era mais forte do que a defesa dos interesses nacionais ou as preocupações com o povo português. Em vez de questionarem a Europa optaram por se colar aos argumentos dos mais beneficiados acusando os seus concidadãos de excessos. Os portugueses eram os culpados, tinham ousado comer uns bifes da vazia em vez de continuarem a comer sopa com sardinhas fritas.
Quando queriam chegar ao poder e reformatar o país sem perguntar aos portugueses se estavam de acordo negavam a existência de uma crise internacional ou europeia, a culpa da crise era do salário mínimo excessivamente alto, do excesso de consumo dos mais pobres ou da ousadia do país de ter um estado social.
Agora que a situação portuguesa é bem mais grave do que a que encontraram há dois anos e já se aproveitam da destruição que provocaram para justificar mais destruição já falam em crise internacional. Agora há dois discursos, quando se pretende despedir funcionários públicos e reduzir a qualidade dos serviços públicos para padrões da primeira metade do século XX dizem que a culpa da crise portuguesa é do Estado consumidor, mas quando se pretendem justificar perante o sector privado para poderem disputar os votos dos trabalhadores deste sector falam em crescimento e já dizem que há uma crise europeia.
Entretanto destruíram uma boa parte do país e não hesitaram em favorecer potências estrangeiras para darem cobertura às suas ambições políticas e ao projecto de transformação do país contra a vontade de todo um povo. A isto chama-se traição.