sábado, novembro 07, 2015

Já murcharam a tua festa pá

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(imagem Jornal Público)


Valeu a pena tentar, uma direita convencida de que tem o direito natural a governar tentou alterar as regras do parlamentarismo, em vez de uma maioria passou a bastar ser o “vencedor” das eleições, não imposta a existência ou não de uma maioria parlamentar, isso é mera aritmética ou, como dizia um conhecido paspalho, a soma de derrotados não dá um vencedor, quem “ganhar” as eleições nem que seja com apenas 10% dos votos tem o direito a governar e a oposição tem a obrigação de viabilizar.
  
De um dia para o outro toda a direita se uniu e até quem durante quatro anos criticou Passos Coelho veio a público em sua defesa, até houve quem visse um golpe de estado, pelos vistos o mais original dos golpes de Estado. No regime parlamentar passaram existir minorias vencedoras e maioria ilegítimas, a eleição de um governo com maioria parlamentar passou a ser usurpação de poder.
  
Desde os tempos das campanhas de Soares Carneiro ou quando todos andavam com sobretudos verdes a imitar Freitas do Amaral, até os nossos latifundiários do Alentejo deixaram as suas capaz na naftalina para irem às lojas comprar o loden austríaco que os identificava com Freitas. Deixou de haver complexos social-democratas, Portas já adora os saloios cavaquistas, até a Ferreira Leite se esqueceu dos amigos de Passos que lhe mostraram o traseiro, quando era a ministra incompetente da Educação. Deixaram de haver complexos social-democratas, neo-liberais ou fascistas, Passos uniu-os quase todos, apenas Capucho, Pacheco Pereira e poucos mais ficaram de fora desta direita unida na conquista do poder.
  
Como se todos estes bons valores não bastassem recorreu-se a tudo, os empresários mais conservadores que resistem aos novos tempos do capitalismo uniram-se porque vinha aí o perigo comunista, os mesmos comunistas que destruíram o país em 1974 e nunca pediram desculpa. Portugal já tinha beneficiado de rezas à antinha de Fátima para sair limpinho, agora os ministros passaram a inspirar-se em Jesus Cristo, as tempestades passaram a ser fúrias demoníaaaacas. O patriarca reivindicou um governo de direita dando a sua bênção ao PaF, se Cerejeira ressuscitasse só estranharia a televisão a cores e a falta do Eusébio e da Amália. Portugal voltava a ser como nunca devia ter deixado de ser.
  
Mas o sonho tornou-se pesadelo e podia recordar-se a segunda versão do “Tanto Mar” de Chico Buarque onde o verso “tanta festa pá” foi substituído por “foi boa a festa pá”, de manhã Passos assegurava que iria ser primeiro-ministro por quatro anos, à tarde assumia-se como líder da oposição e agora ninguém sabe com, que estatuto falará no parlamento na apresentação do seu programa, não se percebe se é um programa de governo ou se está num comício do PaF das eleições antecipadas com que sonhou apresentando o seu programa eleitoral. Esta crise vai proporcionar-nos mais um momento hilariante, quase tão hilariante como ver Cavaco a dar posse ao governo do golpe do estado, das maiorias negativas, das aritméticas, dos usurpadores.
  
Quarenta anos depois o país aprendeu que a direita não mudou muito, anda por aí muito democrata que durante o dia são grandes defensores da democracia e à noite correm ao telefone para escolher Salazar como o melhor português da nossa história. Mas no dia seguinte não há fascistas e vão todos unidos à manif do 1.º de Maio. O país percebeu que a democratização da direita tem muito de postiço e isso explica muito do que por aí se passa, talvez isso explique que os tribunais plenários tenham dado lugares a julgamentos na comunicação social, que haja juízes que achem que a prisão preventiva ainda é pouco e processos judiciais que parece serem conduzidos por obscuros inspectores do fisco.