Talvez um dia o país saiba tudo sobre o BES. O que se passou na família Espírito Santo, as relações entre alguns membros da família e o primeiro-ministro, o papel do então primeiro-ministro na luta pelo poder entre Ricardo e Ricciardi, a resposta da Troika quando a situação do BES lhe foi colocada, o papel de Carlos Costa, um amigo da banca nomeado para um BdP, que vigiava a banca, por um amigo seu e da banca, o ministro das Finanças de Sócrates.
Talvez um dia saiamos o que perdeu o país para que o BES fosse destruído, o que se perdeu com a perda das empresas do GES, o que perdeu com a intervenção no BES, o que perdeu com os prejuízos que foram infligidos a muitos clientes do BES e parceiros das empresas do GES, o que perdeu com o desaparecimento de um banco que financiava muitas das PME.
Talvez um dia fiquemos a saber de quantos políticos chegaram ao poder com a ajuda financeira do BES, de quantos governantes e altos cargos do Estado empregaram os seus familiares e afilhados no universo empresarial do GES.
Sem sabermos de tudo isto nunca saberemos porque caiu um grande grupo empresarial português, nunca conseguiremos saber quanto custou ao país a forma descontraída com que Passos Coelho andou de chanatas na Praia da Manta Rota. Saberemos porque em vez de se equacionar uma solução para a sua sobrevivência, se optou por se perder muito mais para o destruir. Saberemos porque motivo Ricardo Salgado foi o mau, e Ricciardi não só foi o bom como foi premiado.
Tenho muitas dúvidas de que o governo não podia ter resolvido o problema do BES muito antes de deixar de haver solução. Tenho muitas dúvidas de que o grupo tinha sido destruído se José Maria Ricciardi, amigo do então primeiro-ministro, tivesse conquistado o poder no grupo. Tenho muitas dúvidas de que o governador do Banco de Portugal ou os banqueiros que o apoiam alguma vez tiveram como preocupação a continuação e sobrevivência do BES, por mais bom que seja ou tenha ficado depois da “desintoxicação”.
Quem ganhou ou vai ganhar com esta solução?
Vão ganhar os banqueiros que se livram daquele que era o mais dinâmico banco do nosso sistema financeiro, aqueles que por ocasião da resolução tudo fizeram para desnatar o banco, ficando-lhe com os melhores depositantes e os melhores clientes, aqueles bancos que estavam tão mal ou pior do que o BES e se salvaram escondendo-se atrás deles. Daqui a algum tempo os banqueiros do costume vão fazer eleger um primeiro-ministro amigo que em boa hora vai transferir os custos da banca com o processo para os contribuintes.
A banca tem muito a ganhar com uma solução em que o comprador fica com os negócios imobiliários e os bancos desastrados de Portugal dividem entre si os restos do cadáver, como se fossem hienas em torno de uma vítima. Os compradores ficam com o imobiliário, vendem as carteias de encomendas à banca portuguesa e transfere o prejuízo para o Estado através das garantias. Mais tarde o Estado junta a este prejuízo o do fundo de resolução.
Foi para isto que o ex-membro do governo recebeu um balúrdio como caixeiro-viajante do Banco de Portugal, para vender o BES a qualquer preço, sem quaisquer garantias de futuro e, ainda por cima, com a garantia financeira do Estado?