terça-feira, janeiro 10, 2017

Mário Soares e a afirmação da extrema-direita chique

Alguns ideólogos da direita em vez da difamação trauliteira, coisa que não lhe ficaria em ao seu estatuto de gente fina, optam por desvalorizar a democracia e a integração europeia, até desenterram as intervenções do FMI, como se estivesse a estabelecer paralelos históricos. Confesso-me desiludido, esta abordagem revela falta de inteligência em pessoas de quem esperava um pouco mais.

Há quem queira comparar as intervenções do FMI com a recente crise financeira, pelo que comecemos por aqui. Essas intervenções resultaram da falta de divisas num país saído de uma era colonial, com uma indústria escassa em sem competitividade. Uma das intervenções resultou do oportunismo eleitoral de um senhor que se tornou na referência da direita, o então ministro das Finanças da AD, um tal Aníbal Cavaco Silva, numa jogada populista em que se tornou mestre (mais tarde ganhou eleições com um aumento de pensões) fez uma revalorização populista do escudo que levou o país ao desequilíbrio externo. Mais tarde ganhou as eleições abandonando o barco do Bloco Central.

As intervenções do FMI foram transparentes, não ocorreram alterações secretas do acordo, não haviam ministros sombra pagos a peso de ouro com o estatuto de assessores do Vítor Gaspar, o ministro Hernâni Lopes não se demitiu, não inventou desvios colossais, nem teve de fugir. A representante do FMI de então ainda hoje visita Portugal onde é considerada e bem-recebida.

A outra linha de argumentação dos ideólogos da esquerda é a de que os extremismos da direita, o euro-cepticismo e Putin puseram fim à Europa de Mário Soares. O argumento é simples, se o mundo de Mário Soares morreu a sua memória morreu com esse mesmo mundo. Isto é, com a implantação da República D. João II passou a ser um traste da história, com a robotização o fabrico em série de Henri Ford foi uma idiotice, com a vitória do Brexit e a ascensão da extrema-direita fica provado que a democracia é uma idiotice.

A verdade é que em Portugal existiram muitos germanófilos no tempo de Hitler, gente que desapareceu para dar lugares a admiradores dos Aliados, no tempo de Salazar eram todos admiradores do ditador de Santa Coma, com a democracia a ala mais extremista do regime transformou-se em democrata cristã enquanto os mais simpáticos optaram pela metamorfose em social-democratas e até pediram a entrada na Internacional Socialista. Os vira casacas é uma instituição nacional.

Basta ler alguns articulistas do Observador para percebermos como os ideólogos da dessa direita estão em mais uma metamorfose, a democracia e o projecto europeu estão em decadência e anunciam a boa nova do Trump, da Le Pen e do Farage. Ainda não são muito claros no apoio e defesa da extrema-direita que tem tido algum sucesso nas eleições como, aliás, já tinha sucedido no passado com Hitler. Aos poucos os nossos liberais que defendiam a democracia, vão considerando-a um regime desajustado da realidade, e vão transformando as suas teses liberais numa espécie de extrema-direita chique.