quinta-feira, março 08, 2012

Radiografia de uma marosca

Há cinco dias o governo ficou a saber por uma notícia do semanário Sol que o secretários de Estado dos Transportes ordenou, contra o parecer das Estradas de Portugal EP, Que fosse paga à Lusoponte a compensação pela não cobrança de portagens durante o mês de Agosto, apesar dessas portagens terem sido cobradas.

«Em carta enviada no dia 31 de Outubro ao Ministério da Economia, a EP justifica a sua conduta e pede o parecer do secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Silva Monteiro, lê-se no despacho assinado por este, a 21 de Novembro. No mesmo documento, Silva Monteiro desautoriza a EP e ordena-lhe «que proceda, de imediato, à liquidação da quantia em falta».

Segundo o Governo, ainda está em vigor o acordo de 2008 e o desconto apenas poderá ser efectuado no quadro de um novo Acordo de Reequilíbrio Financeiro... o nono. «Está neste momento em fase finalização entre as partes o Acordo de Reequilíbrio Financeiro IX, o qual visa precisamente endereçar esta questão», diz ao SOL fonte oficial do Ministério da Economia.» [SOL]

Mais preocupado com as trapalhadas com o ministro sem pastas Álvaro o primeiro-ministro ignorou a notícia e foi foi para o debate parlamentar sem uma resposta. Quando a obteve deu mais uma das suas lições de moral à oposição, dirigindo-se ao deputado Louçã disse-lhe com aquele ar de QI elevado «“Enquanto aqui estava o secretário de Estado informou que a Lusoponte não ficou com o resultado das portagens cobradas em Agosto porque foram retidas pela Estradas de Portugal”, » [Público]

Já depois de apanhada a marosca o tal secretário de Estado emitiu um comunicado que o portal do Governo em vez de reproduzir vai citando como se fosse a página do DN, coisas que acontecem quando se contratam jornalistas que há muito não sabem se são jornalistas, militantes políticos ou jagunços do Miguel Relvas:

«Com a reintrodução de portagens na ponte 25 de abril decidida pelo Governo no ano passado, surgiu a necessidade de um novo mecanismo de compensação, pelo que «a EP - Estradas de Portugal, SA decidiu unilateralmente deduzir o valor de portagens cobradas pela Lusoponte na ponte 25 de abril em agosto de 2011».

Contudo, este procedimento «não tinha suporte legal, uma vez que esta concessão tem o risco de tráfego transferido para o parceiro privado, pertencendo-lhe integralmente essa receita». O Estado está a promover «a assinatura de um novo acordo de reequilíbrio financeiro o qual regulará esta matéria e permitirá, com base legal, deduzir nos próximos pagamentos de eventuais compensações o valor cobrado pela Lusoponte em agosto de 2011 e que havia sido compensado anteriormente».» [Portal do Governo]

O que o secretário de Estado não explica nem no despacho nem no comunicado é porque razão o dinheiro dos contribuintes está melhor entregue nas mãos da Lusoponte do que do Estado, quando se sabe que apesar de não haver correção do acordo esse dinheiro já ter entrado nos cofres da Lusoponte sob a forma de portagens cobradas.

Esclarecida a trapalhada vale a pena fazer uma análise a esta marosca.

A primeira conclusão que podemos tirar é que Passos Coelho foi mal preparado para o debate e apesar de ter mais jornalistas como assessores do que a maioria das redações dos nossos jornais, não anda bem informado, tendo ido mal preparado para o debate.

A segunda conclusão óbvia é que o secretário de Estado dos Transportes é incompetente pois se sabia que a Lusoponte ia cobrar portagens deveria ter tomado a iniciativa de rever a situação. Não o tendo feito quando a Lusoponte exigiu o dinheiro deveria ter condicionado o pagamento ao novo acordo. Não se percebe como é que a poucos meses de mais um Agosto o tal acordo está por elaborar e a Lusoponte continua com o dinheiro do Estado nas suas receitas.

A terceira conclusão é que este governo tem duas posturas consoante lida com grandes empresas ou com os pobres. Quando se enganou em dezenas de milhares de pequenos subsídios o governo fez as contas muito depressa e mandou recuperar os tostões pagos a mais sem qualquer renegociação ou acordo adicional. Agora que está em caus uma empresa de amigos a coisa tem que ser renegociada, a empresa leva o dinheiro a que não tem direito e deixem estar, não estejam preocupados, quando negociarmos o nono acordo logo fazemos contas. Não é difícil de imaginar que quando o Ferreira do Amaral (o tal ministro que ia fazendo xixi pelas perna abaixo durante o boicote da ponte) ligou para o secretário de Estado este até se terá levantado da cadeira e curvado a coluna como se estivesse na presença de um membro da troika.

A quarta conclusão é que este governo só paga por engano e se esquece de reaver o dinheiro quando está perante grandes interesses. Parece que na cultura deste governo o dinheiro que os portugueses gastam para comprar pão ou medicamentos é dinheiro mal gasto e que deve ser subtraído sob a forma de mais impostos ou cortes salariais. Mas todo o dinheiro entregue a empresas, principalmente se forem geridas por amigos, é dinheiro bem gasto, investido na competitividade e no futuro. Bem dizia o Catroga que o seu salário na EDP se justificava pelo efeito redistributivo do IRS que iria pagar, os portugueses deveriam estar gratos e irem manifestar-se em apoio à Lusoponte na praça das portagens, devido à generosidade do secretário de Estado a empresa pagará mais impostos que serão usados em rendimento mínimo para ajudar os pobres e contribuir para o reajustamento. Devemos estar eternamente gratos ao Ferreira Amaral, com os impostos que ganhará em prémios de gratidão pela sua capacidade de sacar dinheiro ao secretário de Estado os pobres serão menos pobres e os ricos (os donos da Lusoponte) serão menos ricos.